Mude o mundo

23/12/2009

A beleza que passa e a beleza que fica




Conheci a Luíza (Não é o nome dela, óbvio) quando eu tinha 21 anos. Eu estava voltando de uma temporada morando no Rio. Ela tinha mais ou menos a minha idade, e era definitivamente, a guria mais linda que eu tinha visto na minha vida. Ao menos de bem pertinho.
Era estágiária lá no trabalho e por essas coisas que só o imponderável explica, um dia eu lanchava minha coca com recheada, quando ela sentou na minha mesa do refeitório e para a inveja do mundo inteiro, me deu oi.
Era por si só o que podia se chamar de força da natureza. Era tão bonita, que por onde passava todos olhavam. Homens , mulheres, ninguém ficava indiferente àquele morenão caboclo. Como era mais do que clichê, em um mês eu estava babando feito um buldog num prato de carne. E nem namorado era. Eu era apenas o amigo cabeludo, que tinha uma moto bacana e fazia ela dar umas risadas. Aliás, ela TINHA um namorado. Mas não era eu. Eu queria, mas não era eu. Quatro meses depois, ela trocou de namorado. O novo era mais velho e mais rico. Mas não gostava dos amigos dela. E eu, inevitavelmente, sobrei.
Lembro que fazia um mês que não a via. E ela apareceu um belo dia lá em casa e me levou uma maçã. Me entregou e sorriu. Aquele sorriso que toda vida abriu as portas para tudo, escancarado ali na minha frente de novo. Ela me beijou a boca e foi embora. E eu não a vi mais. Só na rua , de relance, ou dentro da camionete do namorado mais velho e mais rico.
O tempo passou. Muito tempo. Fui morar em Porto, quase uma década e um belo dia, reencontrei a figura. Recém separada, com um filho lindo de 5 anos. Veio falar comigo com o mesmo sorriso de quinze anos atrás. Porém alguma coisa mudara ali. Saímos, conversamos, ficamos e enfim... Sim, porque da primeira vez, eu era só o amigo. Não tinha essa parte boa. Fui para casa e fiquei pensando o que tinha mudado nela.Algo estava diferente naquela nossa relação. E aí me dei conta que ela não tinha mudado. EU é que tinha mudado claro. Apenas ela não me assustava mais. Algumas mulheres bonitas e poderosas já haviam passado e já não era tão fácil de minha barriga embrulhar. Acho que desta vez, ela se apaixonou e eu, não.
A beleza, etérea, passa. E se você não acrescenta algo na sua vida, no seu ser, um dia a vida vai lhe cobrar essa conta. A menina linda e deslumbrante, talvez ao longo de seu apogeu, deveria ter se preparado para o declínio do corpo que é natural a todo ser com o passar dos anos. Talvez se fosse uma psícologa ou professora de 35 anos, a falta da beleza dos outrora 20 fosse preenchida por um papo cativante e interessante. Mas não foi o caso.
Se a um menino de 20 anos, a beleza estonteia e desnorteia, a um cara de 30 e vários ela apenas desperta. Mas não é mais fulminante e definitiva para a consumação da sedução. Uma vez vi um intelectual na televisão em uma entrevista dizendo que torcia para que sua filha, recém nascida, fosse feia. Segundo ele, a beleza atrapalhava o desenvolvimento intelectual e espiritual do ser. Não chego a ser tão radical assim, mas existe um fundo de verdade nessa afirmação. A beleza oprime.É cruel. Impiedosa. E isso na verdade, é um fato natural dos seres vivos, não só dos seres humanos. Existe o macaco mais bonito aos olhos da macaca, o leão mais interessante aos olhos da leoa. E na real, não é o problema. Todos gostamos da beleza. Ela alegra os dias, perfuma a alma. Acho que na verdade, só precisamos agregar aos nossos conceitos outras belezas. A beleza da irmandade. Do desenvolvimento intelectual. A beleza de uma cabeça arejada. De um sorriso franco. Tudo bem que isso não vai vender sabonete nem loções na tv. Mas daria a Luiza um perfil mais interessante. Ao invés da bela menina Luíza, talvez tivéssemos a belíssima mulher Luiza.

Hoje a beleza não abre mais portas para ela. Talvez ela tivesse que ter se preparado para abrir suas próprias portas.


Jacques, verão de 2008

2 comentários:

Unknown disse...

Ótimo texto!A blza é algo efêmero,mas ela traz frutos sem esforços e isso faz com que alguns esqueçam o qto é importante crescer e se tornar uma pessoa interessante p/ os outros e p/ si mesma!! Abraços

Claudia Cruz disse...

Parabéns, você consegue expressar de maneira brilhante as inquietações humanas.