Mude o mundo

08/07/2009

A Filosofia dos lobos

Uma das discussões mais antigas da humanidade e que já foi pauta de muitos pensadores e filósofos é sobre o que nos faz diferentes dos outros seres vivos. O que afinal, nos individualiza como espécie e que em última instância permite sermos donos do planeta em que vivemos. Uns dizem que é nossa capacidade de construirmos civilizações, uma após a outra. Alguns dizem que só o ser humano tem a capacidade de discernir entre o bem e o mal. Outros dizem que simplesmente pensamos. Existe a corrente que diz que o uso da linguagem nos torna superiores. E uma corrente mais moderna diz que somos os seres que tem compreensão real da morte, por isso somos únicos. Ah, esqueci da romântica. Capazes de amar. Isso nos faria diferentes.
Acho que é um pouco de todas. Acrescentaria que somos diferentes porque contamos histórias sobre nós mesmos e assim nos compreendemos no tempo. Observando e descrevendo uns aos outros. Assim criamos uma identidade como espécie. Através do tempo, somos um grande conjunto das nossas histórias individuais. Cada vez mais parecidos. Cada vez menos seres unos. Mas toda história que contamos da gente mesmo, tem um lado revelador. Um lado simples e obscuro que nos revela além do comportamento esperado padrão. Lá no fundo, e cada vez menos, vive o nosso Lobo. Selvagem, livre, natural. Cada vez mais suprimido pelo “macaco da homogeneidade”, influências externas e padrões que nos fazem menos “nós mesmos”
Demonizado por religiões cristãs, os lobos sempre foram perseguidos não porque matavam ovelhas e rebanhos, mas porque não podiam ser domesticados e isso na visão destes religiosos, era inconcebível. Na idade média, especialmente, tudo que não se submetesse ao "status quo" era do demônio. Fossem terremotos, eclipses, mulheres-bruxas ou lobos.
A alma , o espírito do ser humano (seja lá o que isso signifique) , ao longo da história sofre tentativas de auto-adestramento. Nós mesmos, em nome de uma pseudo-evolução, vamos nos tornando uniformes e repetitivos. Uma grande cabeça com bilhões de corpos. E matando o lobo que vive em nós.
Acho que a grande característica dessa “uniformização” do ser é que, na regra e como espécie, enxergamos o mundo através da utilidade. Coisas e pessoas. O que esta coisa ou pessoa pode fazer por mim? Mesmo sem saber, essa acho que é a pergunta que fazemos inconscientemente cada vez que nos deparamos com o novo na nossa vida.
Utilidade.
Temos mesmo amigos ou fazemos aliados durante a vida?
Olhamos os outros ou os vigiamos, para nos mantermos sempre atualizados da sua utilidade para nós?
Viver virou sinônimo de esperar. Observar. E dessa observação de uns sobre os outros surge nossa percepção de felicidade. Como o mundo nos vê nos define muito mais do que nossa própria visão de nós mesmos. E só somos felizes se o mundo nos vê bem. O mundo nos agrega e não nós a ele. Não contribuímos mais para a melhoria e evolução da espécie, apenas replicamos indefinidamente valores comuns. Quando falo assim não falo de todo ser humano , óbvio. Mas a verdade é que essas pessoas estão por aí nas nossas vidas e com certeza temos muito mais delas do que gostaríamos de admitir.
Conhecendo os lobos e aprendendo obviamente por metáforas e sem radicalismos interpretativos, a gente pode entender muito mais sobre amizade, doação, sacrifício e individualidade. Falo dos lobos, talvez estudando outros animais pudesse falar das girafas ou dos dragões de komôdo.
Mas não vou me estender sobre o bicho.
Enfim , se a humanidade vai se conhecendo contando histórias de si mesma , eu vou escrevendo as minhas. Um pouco pra achar esse meu lado obscuro, que se manifesta quando a gente externaliza o que pensa, falando ou escrevendo.
Outro tanto pra que meu lado macaco, igual, não sufoque por completo meu lobo.
Fico pensando se essa coisa que todos temos no peito, essa incógnita sobre quem somos, de onde viemos e pra onde vamos, essa constante inconformidade e complexidade que nos caracteriza como seres humanos, essa eterna melancolia de viver, não é a mesma dos lobos, resolvida e comemorada com um simples uivo a plenos pulmões pra lua cheia.



"Quem só tem o espírito da história não compreendeu a lição da vida e tem sempre de retomá-la. É em ti mesmo que se coloca o enigma da existência:ninguém o pode resolver senão tu!"
Friedrich Nietzsche




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